
COVID-19 e requisições administrativas - (ADIN) nº 6362/DF
Trata-se de Ação Direta de
Inconstitucionalidade (ADIN) nº 6362/DF em que se discutiu a
constitucionalidade do art. 3º, caput, VII, e § 7º, III, da Lei 13.979/2020.
A discussão gira em torno do tema da
requisição administrativa. Apenas para melhor elucidação, deve-se lembrar que a
requisição administrativa é a “utilização coativa de bens ou serviços
particulares pelo Poder Público por ato de execução imediata e direta da
autoridade requisitante e indenização ulterior, para atendimento de
necessidades coletivas urgentes e transitórias” (MEIRELLES, 2018, p. 792),
constando com previsão constitucional no art. 5º, XXV, assim como no Código
Civil que prevê a requisição em caso de perigo público iminente, nos termos do
art. 1.228, §3º. Pode incidir sobre bens móveis, imóveis e, até mesmo, serviços
(DI PIETRO, 2018).
A Requerente, Confederação Nacional de
Saúde, pleiteou fosse dada interpretação conforme à CF aos dispositivos (art.
3º, caput, VII, e § 7º, III, da Lei 13.979/2020), a fim de que as requisições
administrativas pelos entes subnacionais só poderiam ser tomadas após estudos e
o consentimento pelo Ministério da Saúde. Além disso, sustentou que, para que
fosse considerado constitucional, seria necessária a prévia audiência do
atingido pela requisição, sempre acompanhada de motivação, com base no
princípio da proporcionalidade e da inexistência de medida menos gravosa.
Apesar dos argumentos, o STF consignou
que o federalismo fortalece a democracia, promovendo a desconcentração do poder
e a aproximação do povo com os governantes, de modo que é natural que
Municípios e Estados-membros sejam os primeiros a serem instados a agir nos
casos de emergência de saúde como o combate ao COVID-19.
Ainda ressaltou que o Estado federal
repousa sobre dois importantes valores: o da inexistência de hierarquia entre
seus integrantes e no princípio da subsidiariedade, sendo que este significa
que tudo o que o ente menor puder fazer de forma mais célere, econômica e
eficaz não deve ser empreendido pelo ente maior.
No âmbito do federalismo cooperativo,
destacou o art. 24, XII, §1º da CF, que estabelece a competência concorrente
para legislar sobre a proteção e a defesa da saúde e a competência material
comum de todos os entes, inclusive do Município, para cuidar da saúde e
assistência pública, nos termos do art. 23, II da CF.
Também apontou que o ordenamento
jurídico brasileiro, antes mesmo da Lei nº 13.979/2020, já admitia a
requisição, com fundamento nos arts. 5º, XXIII e XXV, e 170, III, da CF.
A requisição se trata de instituto
voltado para situações urgentes e inadiáveis, distinguindo-se da
desapropriação, já que na requisição, se a indenização for devida, esta será
posterior. Não dispensa a motivação, devendo-se comprovar o atendimento do interesse
coletivo, consubstanciado na necessidade inadiável do uso do bem ou do serviço
particular em razão do perigo público iminente.
Assim, não cabe ao Ministério da Saúde
analisar todas as requisições administrativas, as quais não podem ser limitadas
pela sua falta de consentimento, sob pena de tornar inexequível o combate ao
vírus.
Por fim, destacou-se a função social da
propriedade, assim como a necessidade de prevalência do direito universal à
saúde para evitar mortes, no caso de conflito entre os princípios da
proporcionalidade, do livre exercício de atividade privada e da transparência.